quinta-feira, 30 de junho de 2011

40/2

Todo o tempo perdido transportando baldes até o quarto para que se enchessem de água devido a uma goteira que se pronunciava de vez em quanto no teto . Todo o tempo perdido com panfletos jogados na sua garagem por algum menino que havia acabado de cheirar cola e precisava comprar mais , panfletos com telefones de pizzarias e churrascarias que você nunca ligou . Tempo gasto com palavras e frases ensaiadas mentalmente para serem ditas no momento certo , e que foram ditas no momento errado ; ou foram ditas no momento certo com o tom errado . Assim como a música , as palavras a serem ditas precisam ter o tom certo , ou um simples “ não sei “ pode se transformar em algo mais profundo e raivoso .

Procuramos por conforto nessa cidade alucinada e fascinante que não me deixava com preguiça de levantar da cama de manhã . Passei minha vida buscando oportunidades e relações nos lugares errados .

A verdade é que nunca nos encaixamos nessa merda toda de “ amigos para sempre .” Para nós , a verdadeira essência de alguma coisa , era o simples fato de nos sentarmos no banco de um cemitério qualquer e dividirmos o último cigarro do meu maço .

A louça está transbordando na pia e as baratas começaram a se manifestar . Nada parece mais importante para mim do que a inspiração que chega no momento em que vejo uma mãe carregando uma criança que geme de dor enquanto todos passam por ela e nem a notam . Eu não a ajudei de maneira nenhuma , mas pelo menos eu a notei e me senti mal por ela .

O tempo ali funciona de uma maneira diferente . 40 anos em 2 meses . Isso é mais comum de se acontecer do que podemos imaginar .

sábado, 18 de junho de 2011

Catolicismo

Nada demais , nada pesado .

É aquela angustia cravada no peito que faz você acordar às 3 da tarde desejando ser 10 da noite de um sábado .

Os dias são folheados feito as páginas de um livro velho e amareladas ; um livro cuja escrita de tão precária e antiga , te faz ler e reler a mesma página umas três vezes para ver se consegue tirar algum proveito espiritual daquilo tudo . É muito complicado .

Muitas vezes quando acordo na minha cama , me encontro em devaneios passados . Parece que durante o sono , caminhei pelas mesmas ruas de anos atrás . Me sinto triste .

Vejo o número 33 escrito por ela para dar sorte , no portão da garagem da minha casa . Penso naqueles rabiscos feitos por aquelas mãos que agora não passam de comida para vermes a muitos palmos abaixo de mim .

Penso em voltar ao passado , mas depois penso que voltando ao passado não mudaria o futuro . Posso mudar os caminhos , mas não o destino final .

A morte não me soa triste , pelo contrário , soa como um sino na minha cabeça desiludida por mentiras falsas inventadas por paixões comerciais que me vendem sentimentalismo barato desde o dia em que comprei minha primeira revista .

Penso no quão triste deve ser o arrependimento final . Aquela hora em que você se arrepende por nunca ter pego seus filhos e colocado-os todos num ônibus e partido para Santa Catarina para passar um fim-de-semana . O momento crucial . Aquele momento o qual você entende que tudo o que você fez por orgulho , inveja ou vingança , não passou de nada . Não significou nada . Uma página em branco numa vida vivida cegamente pelo ódio gratuito .

Que triste deve ser ter consciência dos seus atos tarde demais . Não há mais ninguém na sala para se desculpar , nenhum amigo responde suas mensagens , ninguém existe para que você lhe diga que sente muito pelos seus comentários inapropriados cuspidos em hora de rebeldia e descontentamento consigo mesmo .

E por detrás daquela árvore , eu te vejo plantando ervas e cantarolando uma canção que você aprendera na sua juventude , uma juventude roubada pelo catolicismo e pelo ensinamento de uma sociedade que nunca caminhou por si mesma .

"(...)Claro que você não tem culpa, coração, caímos exatamente na mesma ratoeira, a única diferença é que você pensa que pode escapar, e eu quero chafurdar na dor deste ferro enfiado fundo na minha garganta seca que só umedece com vodka, me passa o cigarro, não, não estou desesperada, não mais do que sempre estive, nothing special, baby, não estou louca nem bêbada, estou é lúcida pra caralho e sei claramente que não tenho nenhuma saída, ah não se preocupe, meu bem, depois que você sair tomo banho frio, leite quente com mel de eucalipto, gin-seng e lexotan,depois deito, depois durmo, depois acordo e passo uma semana a ban-chá e arroz integral, absolutamente santa, absolutamente pura, absolutamente limpa, depois tomo outro porre, cheiro cinco gramas, bato o carro numa esquina ou ligo para o CVV às quatro da madrugada e alugo a cabeça dum panaca qualquer choramingando coisas do tipo preciso-tanto-de-uma-razão-para-viver-e-sei-que-esta-razão-só-está-dentro-de-mim-bababá-bababá, até o sol pintar atrás daqueles edifícios, não vou tomar nenhuma medida drástica, a não ser continuar, tem coisa mais destrutiva que insistir sem fé nenhuma?”

CAIO F .

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Economia

Arrebento linhas imaginárias do que um dia FOI . Dedilho uma por uma , arrebento-as feito as cordas de um violão esquecido dentro do porta-malas de um carro que fora jogado de um precipício , no mar .

Ouço músicas memoráveis de pessoas destruídas por suas próprias crenças . Pessoas traídas por seus deuses particulares e que tiveram que se render à um grupo fechado de amigos que lêem Nietzsche e conversam sobre economia .

Não me interesso por Nietzsche . Me interesso pelo autor desconhecido que escreve sobre cachorros e suas bondosas almas de anjos incansáveis que lambem nosso traseiro sem quererem nada em troca .

É inadmissível passar uma vida inteira afirmando que o homem nunca chegou à Lua . A questão não é a Lua , mas sim o homem . A questão não é o Céu , mas sim Deus .

Converso todas as noites com algo que desconheço , e mantenho relações amigáveis com pessoas que conheço , mas na verdade não conheço .

Dividimos nosso precioso tempo entre relacionamentos que nos são enfiados goela abaixo e privações literárias e lingüísticas de opiniões que pertencem à maioria mas são guardadas por medo . O medo nos controla . O medo me controla . Medo de dormir e nunca mais acordar . Medo de ficar tetraplégica . Medo de que cortem meu cabelo sem a minha permissão . Medo de ficar sem ele , medo de não ser eu mesma . Então todos meus medos são colocados em prática , e percebo que não tenho controle nenhum sobre mim . Já me vi no controle das vidas de outras pessoas , mas acho que isso acontece com todo mundo .

Tenho uma missão , sei que tenho mas não sei qual é . Sendo assim , caminho por essa estrada de terra escura e úmida , a qual o núcleo é um lago . Um lago de lamentações e de ressentimentos . Meu lago . Mergulho e me encontro com um saco de ossos , que através de um fêmur escurecido , me diz que devo mergulhar mais fundo . Tenho medo de mergulhar mais fundo e me deparar com um monstro imenso , comprido feito uma enguia de 5 metros com dentes afiados que me observam sobressaltados de seu lábio inferior .

Não me impressiono com sangue e nem com torturas intermináveis . Não me impressiono com palavras bonitas escritas em um texto metricamente feito para encher os olhos dos apaixonados de lágrimas . Não me impressiono com riqueza e nem com pobreza . Me impressiono com a sinceridade e naturalidade vindas de todas as formas .

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Navios

Que equívoco é a nossa vida . Tudo errado desde sempre . Idéias formadas por terceiros , marcas possessas por demônios egípcios , amigos na fogueira e amantes separados .

À minha porta . É onde tudo sempre esteve : à minha porta .

Observo de longe acenos de mãos e abraços sinceros , enquanto estou parada com as duas malas e não aparece ninguém para me buscar . O que eu fiz de errado ? Talvez tenham descoberto que fui eu quem vomitou no antigo vaso de violetas . Não , não pode ter sido isso . Tínhamos um cachorro doente na época . O vento remexendo nos meus cabelos e tenho a impressão de que ainda estou dormindo no meu quarto de hotel há milhas daqui , sentindo cheiro de leite azedo e desejando nunca acordar . Mas aqui estou eu novamente . Lá vamos nós novamente .

Andando em círculos e pisando em calos já calejados e coçando feridas que nunca cicatrizam . Filme novo na TV , último lançamento nas livrarias , último jogo do Wii , e nada que me interesse mais do que ser a reencarnação do Kerouac . Não sou reencarnação de ninguém .

Há muito mais nos oceanos do que simplesmente a carcaça de navios fantasmas ou corpos sendo comidos pelo camarão que meses depois estará dentro da moranga que sua mãe vai preparar para o Natal . Como você quer exigir alguma coisa de mim se você não levanta a bunda do sofá para mijar ? Todos os dias o cheiro forte de urina me acorda feito um despertador . Eu sei como : Você gosta mais de mim do que de você mesmo . Não sou tão idiota assim .

A consideração não é algo que se deva ser cobrada . Não se pode exigir o amor de ninguém . Se eu tenho que te lembrar que eu sou sua mãe e você deve me respeitar , então você não vale mais do um absorvente usado para mim .

O que vem com naturalidade é o que é verdadeiro . Sempre achei que devesse rir de algumas piadas por obrigação .

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Margaridas

Deus me passou pela cabeça hoje . Voando numa vassoura como a Bruxa Má . Que interessante é saber que Vivienne Westwood não lê revistas de moda ; e que bom é saber que tenho uma vida mais ou menos acomodada pela frente .

Se você é ateu , por exemplo , e não come carne em respeito aos animais , isso quer dizer que você possui consciência , e essa consciência funciona em função do que aparentemente é FAZER O BEM para você , mas os ateus não deveriam fazer o bem , pois se você não acredita em nada , como pode temer fazer o mal ? Não existe o “ aqui se faz aqui se paga “ para você . Encha o cu de carne e durma feito um bebê .

Não sou digna de fazer nenhum tipo de julgamento , já fiz tanta merda que a consciência costumava pesar no travesseiro durante a noite . Nunca fiz mal à ninguém a não ser à mim mesma , sempre .

E eu acordo de pesadelos inimagináveis e me levanto para fazer xixi , e enquanto estou sentada na privada olhando para o chão , por um momento não sei se ainda estou sonhando ou aquela é a deprimente realidade da vida : eu , sentada em algo ridículo , fazendo xixi . E depois escovo os dentes e volto para debaixo das cobertas feito um filhinho de papai que acabou de estuprar sua colega de classe e volta para casa para os braços da mamãe .

Nunca me dei ao trabalho de guardar rancor ou ódio , a não ser , mais uma vez , de mim mesma . Sou minha maior inimiga . A pessoa que mais odeio e que mais amo .

Às vezes ouço Deus na minha janela à noite . Ele bate nela como se quisesse entrar , mas tenho medo dele . Imagino que ele use luvas pretas de couro alienígena .

E aplaudo emocionada mais uma encenação perfeita da peça A Felicidade Me Pertence , enquanto alguém deixa margaridas na minha porta .

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Rainha

Sonhos . Passagens . Rituais . Não sei diferenciar um do outro e me entupo com chá de berries .

Tão marcante quanto a fragrância de um Dolce , são as palavras proferidas intuitivamente a algum andarilho que lhe pediu por umas moedas . Essas palavras foram absorvidas pelo subconsciente do segundo e transformadas em magia e em seguida penetraram por entre as suas narinas e agora você nada mais é do que um boneco de cera que expele merda pela cavidade bucal .

Tão negros vêm sendo esses anos . Livros intermináveis e nenhuma lição de vida aprendida . Promessas em branco e protetores malignos que me observam durante a noite enquanto procuro desesperadamente pelo edredom que derrubei no chão . Superficialidade em alta e sentimentos varridos para debaixo do tapete enquanto você espreme aos poucos meu coração que não produz mais nenhum tipo de suco , a não ser um líquido espesso para o qual ainda não inventaram um nome .

E eu sinto tudo descendo pela garganta , passando pela faringe e se acomodando no estômago .

Falsa memória atrapalhando um futuro nada promissor que caminha por entre portas apertadas de uma mente tão sã que se duvida .

Dúvida . Duvido de todos depois de anos depositando sinceridade em cofres aparentemente de ouro maciço mas que no final descobri que eram todos falsificados pois com um simples e inofensivo chute , se quebraram . Um cofre bom deve agüentar muitos chutes . Nunca tive essa sorte . Talvez ninguém tenha . Talvez esses cofres não existam . Ou sejam raros como esses quadros do Van Gogh . Talvez a Rainha possua um . Não sei . Acho que não .

E lá estávamos nós , todas as manhãs nos desvencilhando de obrigações que já são chatas por natureza pois são obrigações , se não fossem chatas não seriam obrigações . Um cigarro atrás do outro , um amor platônico a cada esquina e a alma escorrendo pela língua enquanto raciocinávamos sobre a briga da noite passada .