sábado, 23 de fevereiro de 2013

Em todo lugar?



    Sinto por um momento o cheiro doce e amanteigado desse lugar fictício que frequenta minha memória fraca, e nos tráz de volta ao ano cujos números não me recordo.
    Aqui é calmo, e as conversas parecem irrelevantes, e ninguém parece estar realmente interessado no que o outro tem a dizer. Seria um teatro? Mas um teatro não teria tão péssimos atores.
    O vento grita por entre as frestas das janelas e portas pintadas rusticamente de um verde moribundo que me faz ter vontade de acender um charuto.
    Eu o vejo lá, parado perto do balcão, olhando para cima tentando ver o que está na promoção hoje, mas tenho a impressão de que ele está rindo por dentro. Ele provavelmente ri das mesmas coisas que eu, e deve achar esse lugar de muito mau gosto. Ele provavelmente não gosta daqui, já deve ter se desentendido também com o motorista do ônibus.
    Sinto que alguém me observa, e olho para trás e vejo aquela mesma senhora com o carrinho de compras cheio de verduras e cenouras, e penso no quão patética ela é, porque a vejo todos os dias com o mesmo carrinho de compras com a mesma quantidade de verduras e cenouras, mas então penso que frequento o mesmo lugar todos os dias e não me acho patética.
    A solidão tenta me negativar por um breve segundo, um pensamento de tristeza profunda surge em minha cabeça, e então me espanto quando o vejo ali ainda parado no mesmo lugar sem saber o que pedir. Será que ele está perdido aqui, ou em todo lugar?